Contrassenso: Shell promete energia mais barata, sem PPI

Contrassenso: Shell promete energia mais barata, sem PPI

Há poucos dias, o Estadão divulgou uma reportagem sobre o interesse de multinacionais no gás natural para a implantação de usinas termoelétricas no estado do Rio de Janeiro. Só em Macaé tem projetos de cinco usinas. (https://economia.uol.com.br/noticias/estadao-conteudo/2021/08/01/gas-natural-atrai-interesse-de-gigantes.htm?cmpid=copiaecola)

A matéria afirma que três grandes empresas apostam no gás natural do pré-sal para gerar energia elétrica térmica a preços compatíveis com os das hidrelétricas. Um desses investidores é a petrolífera Shell, a segunda maior produtora de gás natural no país – a primeira é a Petrobrás.
A Shell é quem vai fornecer o gás para a usina, extraído por ela da Bacia de Santos. E pasmem: a um valor mais competitivo, porque a multinacional anglo-holandesa diz que não vai atrelar o preço do gás natural ao dólar e a cotações internacionais, como fazem suas concorrentes.
No Brasil, a política de preços adotada pelo governo federal desde o golpe de 2016, e imposta à Petrobrás, é o Preço de Paridade de Importação (PPI) para o petróleo, gás natural e derivados. Na prática, mesmo o produto sendo nacional, produzido no nosso país, compramos a preço de importado. Por isso, os combustíveis e o gás de cozinha sofrem aumentos constantes e nós, os consumidores, pagamos tão caro por eles.
Agora, o inacreditável é a Shell vender, no Brasil, um combustível mais barato do que a Petrobrás. A multinacional vai comercializar o gás natural a preço nacional, não atrelado ao preço de importação (PPI). Vai vender a preço brasileiro, muito mais barato, prometendo gerar energia mais barata do que a das hidrelétricas.
A estatal brasileira, criada a partir de movimentos populares para abastecer o Brasil e assim livrá-lo da dependência do petróleo importado, após atingir a tão sonhada autossuficiência vende, por decisão governamental, seus produtos ao seu povo como se importados fossem! Enquanto a multinacional estrangeira comercializa seu gás a preços nacionais.
Vivemos no Brasil, após as eleições de 2018, uma realidade cada vez mais insólita!
Os movimentos ambientalistas de Macaé e região estão questionando muito a opção pela energia termoelétrica em função de sua pegada de carbono, ainda que utilize gás natural e, principalmente, seu alto consumo de água, um bem muito escasso para a população da cidade e região, que vive sob eterno racionamento.
Outro problema crítico são as linhas de transmissão de alta tensão (500 kV) que exigem uma faixa de 80 metros de largura, cujo traçado foi questionado pela população durante audiência pública e processo de licenciamento ambiental. Esse traçado ignorou a ocupação antrópica (condomínios e habitações rurais) e os raros remanescentes de mata na paisagem dominada por pastagens, separando dois deles e cortando um terceiro que é zona de amortecimento de reserva biológica.
Como ativista ambiental, participei desses questionamentos, liderando a questão da linha de alta tensão, e sou testemunha que, infelizmente, os empreendedores e o órgão ambiental do estado do RJ ignoraram solenemente os questionamentos da população e sequer apresentaram alternativas, das inúmeras possíveis. Um processo pra “inglês ver” que prioriza o custo e o lucro acima da saúde das pessoas e do meio ambiente.